O built to suit e a Administração Pública – Lei de Licitações em Conta Gotas

Por Marina Luiza Amari e Isabella Bittencourt Mäder Gonçalves Giublin

built to suit é um contrato empresarial em sua essência. Pode ser explicitado como um negócio em que um empreendedor é responsável por uma construção sob medida ao critério de um usuário. A construção ou reforma do imóvel pode ser antecedida, ou não, de sua compra pelo empreendedor. A remuneração do usuário ao empreendedor leva em consideração o uso do imóvel e o investimento realizado pelo segundo para a confecção da obra nos moldes exigidos pelo primeiro.

No âmbito do Direito Privado, muito embora seja um contrato tipicamente social há tempos, o tema foi abordado pela Lei de Locações, no art. 54-A, após o ano de 2012 — daí a superveniência de interpretações que aproximam o built to suit de uma locação de imóvel urbano.

No Direito Público o tema é mais recente. A Lei 13.190/2015 alterou o Regime Diferenciado de Contratações (RDC), introduzindo expressamente, por meio do art. 47-A, a previsão de que a Administração Pública pode celebrar contratos built to suit[1]. Para o Direito Público, o contrato é retratado como locação tanto de bens móveis, quanto de imóveis.

Mesmo com a superveniência da Lei nº 14.133/2021, é possível afirmar que a Administração Pública ainda poderá realizar negócios nos moldes built to suit, por força do art. 89, que prevê a aplicação supletiva das disposições de Direito Privado. Tal prática, portanto, encontraria fundamento no art. 54-A, da Lei de Locações, mas também, encontra respaldo na doutrina e jurisprudência passadas (inclusive do TCU), que admitem o uso do built to suit. Aliás, tal autorização encontra amparo desde a Lei 8.666/1993, art. 24, X, o qual permitia a locação sob medida ou sob demanda, mediante contratação direta pela Administração Pública.

À mesma conclusão se chega se analisados os arts. 51 e 74, da 14.133/2021, que ditam, respectivamente, que “ressalvado o disposto no inciso V do caput do art. 74 desta Lei, a locação de imóveis deverá ser precedida de licitação e avaliação prévia do bem, do seu estado de conservação, dos custos de adaptações e do prazo de amortização dos investimentos necessários” e “é inexigível a licitação quando inviável a competição, em especial nos casos de: V – aquisição ou locação de imóvel cujas características de instalações e de localização tornem necessária sua escolha”.

Portanto, à guisa do que dispõe referidos dispositivos, é possível afirmar que o modelo negocial se mostra possível, podendo ser inexigível a licitação, quando (i) houver prévia avaliação do bem e do seu estado de conservação, bem como do prazo de amortização dos investimentos, (ii) não houver outro imóvel público vago e disponível que atenda ao objeto, mediante certificação, e (iii) for justificada a singularidade do imóvel a ser locado, evidenciando a vantagem para a Administração Pública.


[1] Esse dispositivo legal, que autorizava a celebração do built to suit, na Lei do RDC, teve seus efeitos suspensos diante de decisão proferida pelo STF até o ano de 2018.

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